TÓPICO ESPECIAL: "os filhos de Deus" em Gênesis 6
A. Há uma grande controvérsia sobre a identificação da frase "os filhos de Deus". Há três interpretações principais
1. a frase se refere à linhagem piedosa de Sete (cf. Gênesis 5)
2. a frase se refere a um grupo de seres angelicais
3. a frase se refere aos reis ou tiranos da linhagem de Caim (cf. Gênesis 4)
B. Evidência para a frase referindo-se à linhagem de Sete
1. o contexto literário imediato de Gênesis 4 e 5 mostra o desenvolvimento da linhagem rebelde de Caim e a linhagem piedosa de Sete. Portanto, as evidências contextuais parecem favorecer a linhagem piedosa de Sete.
2. os rabinos têm se dividido sobre seu entendimento dessa passagem. Alguns afirmam que isso se refere a Sete (mas a maioria a anjos).
3. a frase, "os filhos Deus", embora mais freqüentemente usado para seres angelicais, raramente se refere aos seres humanos
a. Dt 14.1, "filhos sois do SENHOR, vosso Deus"
b. Dt 32.5, "seus filhos"
c. Salmo 73.15, "teus filhos"
d. Oséias 1.10, "filhos do Deus vivo"
C. Evidência para a frase referente a seres angelicais
1. esse tem sido o entendimento mais comum da passagem. O contexto maior de Gênesis poderia apoiar essa visão como outro exemplo de um mal sobrenatural tentando frustrar a vontade de Deus para a humanidade (os rabinos dizem que foi por ciúme)
2. A frase ("filhos de Deus") é usada abundantemente para anjos no AT
a. Jó 1.6
b. Jó 2.1
c. Jó 38.7
d. Salmo 29.1
e. Salmo 89.6, 7
f. Daniel 3.25
3. o livro intertestamentário de I Enoque, que era muito popular entre os crentes do período do NT, junto com Gênesis apócrifo dos rolos do Mar Morto e Jubileus 5.1, interpreta esses como anjos rebeldes ( I Enoque 12.4; 19.1; 21.1-10).
4. o contexto imediato de Gênesis 6 parece implicar que "os valentes que houve na antiguidade, homens de renome" vieram dessa mistura imprópria das ordens da criação
5. I Enoque ainda afirma que o Dilúvio de Noé veio para destruir esta união entre anjos/seres humanos que era hostil a YHWH e Seu plano para a criação (Cf. I Enoque 7.1ss; 15.1ss; 86.1ss)
D. Evidência para a frase referindo-se aos reis e tiranos da linhagem de Caim
1. Há várias traduções antigas que apóiam essa visão
a. Targum ou Onkelos (segundo século A.D.) traduz "filhos de Deus" como "filhos de nobres"
b. Símaco (segundo século A.D.), tradução grega do AT, traduz "filhos de Deus" como "os filhos dos reis"
c. O termo elohim é às vezes usado para os líderes Israelitas (cf. Êx 21.6; 22.8; Sl 82.1, 6, observe NVI e Net Bibles)
d. Nefilins é ligado a Gibborim em Gênesis 6.4. Gibborim é o plural de Gibbor que significa "um poderoso homem de bravura; força, riqueza e poder"
2. essa interpretação e suas evidências são tiradas do livro Hard Sayings of the Bible [Expressões Difíceis da Bíblia], pp. 106-108
E. Evidência histórica dos defensores de ambos os usos
1. a frase refere-se aos setitas
a. Cirilo de Alexandria
b. Teodoro
c. Agostinho
d. Jerônimo e. Calvino
f. Kyle
g. Gleason Archer
h. Watts
2. a frase refere-se a seres angelicais
a. Escritores da Septuaginta
b. Filo
c. Josefo (Antigüidades 1.3.10
d. Justino Mátir
e. Clemente de Alexandria f. Tertuliano
g. Orígenes
h. Lutero
i. Delitzsch
j. Hengstenberg k. Olford
l. Westwerm
m. Wenham
n. Biblia NET
F. Como os "Nefilins" de Gênesis 6.4 são relacionados com os "filhos de Deus" e "as filhas dos homens" de Gn 6.1, 2?
1. Eles são gigantes que resultaram da união entre anjos e mulheres humanas (cf. Nm 13.33).
2. Eles não se relacionam em absoluto. São simplesmente mencionados como estando na terra nos dias dos eventos de Gn 6.1, 2 e também depois.
3. R. K. Harrison, em Introduction to the Old Testament [Introdução ao Antigo Testamento, p. 557, tem a seguinte citação enigmática, "perder totalmente as percepções antropológicas inestimáveis na inter-relação do Homo sapiens e as espécies pré-adâmicas que a passagem contém, e que são expostas àqueles estudiosos que estão preparados para persegui-las".
Isso implica para mim que ele vê esses dois grupos como representando diferentes grupos de humanóides. Isso implicaria uma criação especial posterior de Adão e Eva, mas também um desenvolvimento evolucionário do Homo erectus.
G. É apenas justo revelar meu próprio entendimento desse texto controverso. Primeiro, deixe-me lembrar a todos nós que o texto em Gênesis é curto e ambíguo. Os primeiros ouvintes de Moisés devem ter tido percepção histórica adicional ou Moisés usou tradições orais e escritas do período patriarcal que ele mesmo não entendia completamente. Essa questão não é um assunto teológico crucial. Nós freqüentemente somos curiosos sobre coisas que as Escrituras apenas dão uma pista. Seria muito inoportuno construir uma elaborada teologia a partir desse e de fragmentos similares de informação bíblica. Se precisássemos dessa informação, Deus a teria providenciado de uma forma mais clara e completa. Eu pessoalmente acredito que eram anjos e seres humanos, porque:
1. a frase "filhos de Deus" é usada consistentemente, se não exclusivamente, para anjos no AT
2. a Septuaginta (alexandrina) traduz (final do primeiro século A.C.) "filhos de Deus" como "anjos de Deus"
3. o livro apocalíptico pseudoepigrafo de I Enoque (possivelmente escrito por volta de 200 A.C.) é muito específico que isso se refere a anjos (cf. capítulos 6-7)
4. II Pedro 2 e Judas falam de anjos que pecaram e não mantiveram sua habitação apropriada. Eu sei que para alguns isso parece contradizer Mt 22.30, mas esses anjos específicos não estavam nem no céu nem na terra, mas numa prisão especial (Tártaro).
5. Eu acho que uma razão das muitas dos eventos de Gênesis 1-11 são encontradas em outras culturas (i.e., relatos similares da criação, relatos similares do dilúvio, relatos similares de anjos possuindo mulheres) é porque todos os seres humanos estavam juntos e tiveram algum conhecimento de YHWH durante esse período, mas depois da dispersão da torre de Babel, esse conhecimento se tornou corrompido e adaptado a um modelo politeísta.
Um bom exemplo disso é a mitologia grega onde gigantes meio humanos/meio sobrenaturais chamados titãs são aprisionados no Tártaro, este exato nome usado somente uma vez na Bíblia (II Pe 2) para lugar de aprisionamento dos anjos que não mantiveram sua moradia própria. Na teologia rabínica Hades era divida numa seção para o justos (paraíso) e uma seção para os ímpios (Tártaro).
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